segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Mamma Calábria

Os filhos da Calábria retornam para o Natal. Voltam das importantes cidades do norte onde a vida parece dizer-lhes sim: Roma, Pisa, Bolonha, Gênova, Milão e Turim. Uns Ulisses, outros Don Quixotes, todos guerreiros: os filhos da Calábria retornam ao colo de suas mães para festejar o nascimento de Gesù Bambino. O verde-vivo rasteiro da terra é o tapete invernal dos montes calabreses. Estende-se sem vergonha e sem fim por planuras e penhascos, cobrindo tudo o que vê e tudo o quanto pode. As árvores emagrecem no inverno, perdem folhas e frutos, são troncos e galhos secos enrijecidos como as galinhas depenadas para a ceia de Natal. Piuí. Piuí. O trem atravessa a comarca: de um lado as montanhas em contornos de nanquim, e do outro a ribanceira com o mar que á azul no verão e verde no inverno. O verde-vivo do tapete invernal dos montes calabreses colore o mar. Colore os olhos daqueles que olham pela janela do trem. Colore a melancolia das mães que esperam o ano todo o retorno de suas crias.
Na Calábria camponesa as casas são labirintos: três, quatro, cinco andares. Na expectativa de que um dia os filhos regressem definitivamente com suas esposas e crianças para habitarem o lar, os pais ampliam o concreto, constroem novos cômodos, ulteriores escadas e tantas janelas em continuidade. Das janelas do primeiro andar acompanham as estações, observam o verde da terra que seca no verão, os tantos pés de figo da Índia com as cabras que pastam ao redor, o vento mediterrâneo que balança as laranjeiras em flor, e a colheita outonal da azeitona. Das suas janelas Mamma Calábria enxerga o mar verde de inverno e o trem que traz os filhos para a festa de Natal. Piuí. Piuí.
Até o dia dos Três Reis Magos Mamma Calábria é em festa, beija e abraça suas criaturas e cozinha para elas como quem cozinha a oferenda para o santo. Calábria colorida, perfumada, saborosa. Mas como a alegria tem prazo de validade fato está que o mesmo trem que atravessou esplanadas e montes como a estrela cadente de Belém, agora parte com os filhos do campo, estudantes e trabalhadores rumo ao norte. As casas calabresas estão sempre no reboco, a reforma dura anos e suas tantas janelas continuarão fechadas. Os filhos da Calábria vêm e vão, poucos permanecem. Mamma Calábria suspira, entristecida, pelas suas enormes casas vazias.

2 comentários:

Marana Borges disse...

O texto já diz tudo, as imagens estão ali. Lindas. Paisagem e história são bailarinas dessa narrativa. Mas confesso que fiquei ansiosa para ver a Calábria em outra linguagem, a qual você tão bem sabe explorar: a fotografia. Aguardo.

Anahí Borges disse...

Pois é, desta vez vou ficar te devendo... não tirei fotografia porque minha câmera pifou:-(
bjo Má!