terça-feira, 4 de março de 2008

As sete cores de Franco Zeffirelli




Na última terça-feira foi celebrada no Centro Sperimentale di Cinematografia a abertura do ano acadêmico. Um evento um pouco tardio, afinal, as aulas jà começaram hà quase dois meses, mas a razào desse atraso foi a crise política então instalada no país com a queda do governo Prodi.

Na cerimônia estavam presentes algumas figuras pùblicas significativas, tais quais Francesco Alberoni, presidente da Fundação Centro Sperimentale, Giuseppe Cereda, diretor da Scuola Nazionale di Cinema e Francesco Rutelli, atual ministro no Ministério per i Beni Culturali e provável próximo sindaco (prefeito) de Roma. Alguns ex-alunos que marcaram a história do cinema e da televisão italianas foram homenageados, recebendo, cada um deles, um diploma de reconhecimento e realizando um pequeno discurso para um auditório com cerca de 400 pessoas. Foram: Elli Parvo, atriz que marcou o cinema dos anos 40 e 50; Raffaela Carrà, atriz do cinema dos anos 60 que se transformou em uma das mais modernas showgirls da televisão italiana sendo considerada hoje uma diva; Arnoldo Foà, mítico ator italiano de origem judaica que possui no currìculo mais de 100 filmes e peças tatrais realizados desde os anos 30; Carlo Lizanni, grande nome do cinema neo-realista e político italiano e por fim, Franco Zeffirelli, diretor-pupilo de Luchino Visconti, que consolidou sua carreira nos Estados Unidos e realizou dentre tantas obras, o clàssico “Romeu e Julieta”, “A Paixào de Cristo” e “Irmào Sol, Irmà Lua”.

Franco Zeffirelli, em seu discurso, denunciou o isolamento que sofreu nos anos 60, quando iniciou sua carreira cinematográfica na Itália: “Eu fui expulso da Associação Italiana de Autores porque eu propunha outro tipo de cinema, diverso daquele que então era feito. Eu era contra o cinema político-ideológico e pornográfico, meu cinema era de poesia, um cinema que resgatava o princípio do amor e da pureza”. Depois de continuar a sua fala agressiva e um pouco ambígua, onde não se compreendia se elogiava ou ironizava diversas figuras da cena cinematográfica contemporânea, Zeffirelli abalou os alicerces do cerimonial tocando no assunto sexualidade. A origem deste desenlace foi a apresentação inicial de seu breve currículo feita pelo mestre de cerimônias, a qual em determinado momento dizia que este cineasta é antes de tudo um grande artista, que teve significativa atuação além do cinema, em outras duas linguagens artìsticas, o teatro e a ópera, e que, portanto, poderia se dizer que Zeffirelli é um apaixonado que possui 3 mulheres. E eis que Zeffirelli, nos momentos finais de seu discurso de agradecimento, resgatou esse comentário inicial do mestre de cerimônias para desestabilizar uma mesa composta por senhores sérios, aparentemente católicos, heterossexuais na cama e centro-direita na política, quando não direita total, digamos assim. “Eu gostaria de comentar que quando fui apresentado como um artista apaixonado que possui 3 mulheres, quem disse que são mulheres? É preciso deixar claro os seus sexos”. O público de jovens caiu na gargalhada e os senhores à mesa, e mesmo aqueles à platéia imergiram em um profundo constrangimento, mudando até a cor da cara. Vermelho. Silêncio. Zeffirelli prossegue: “O teatro é masculino. A ópera é feminina. E o cinema, tutti e due”. Mais risadas juvenis contrapesadas com o silêncio mumificado das meia e terceira idades cristãs. O cinema è bissexual! O cinema è bissexual!

Zeffirelli agradeceu e voltou ao seu lugar, acompanhado por aplausos calorosos. E foi assim que descobri que uma cerimônia formal de centro-destra pode ser abalada por piccolas questões de foro íntimo. E aprendi também que bicha em italiano é “frocio”.

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