Claro que sinto saudades do Brasil! Mas se existe algo que categoricamente afirmo ser melhor aqui do que lá é: a possibilidade de estar tranqüilo pela rua. Mamma mia! Mesmo com as notícias bombásticas de violência diária promovidas pelos jornais de orientação berlusconiana para denegrir a imagem dos imigrados na Itália, fato é que em Roma existe a tranqüilidade em sair de casa. A cultura do medo e da violência que existe no Brasil é a minha escravidão, a neurose que inoportunamente disciplina a minha vida paulistana. Conversando com um amigo a respeito, que vivendo em Madrid também tem a mesma impressão, soube do texto de Maria Rita Kehl chamado "Você tem medo de quê?" no qual reflete sobre esta questão. É um texto essencial para se compreender como a tranqüilidade é considerada hoje um privilégio e que, na verdade, viver com medo que é uma grande humilhação. Abaixo transcrevo alguns fragmentos:
"Vou direto ao ponto: estive em Paris. Está dito e precisava ser dito, logo verão por quê. Mas é difícil escapar à impressão de pedantismo ou de exibicionismo ao dizer isto.
Culpa da nossa velha francofilia (...) Se eu disser “fui a Paris”, o interlocutor responderá sempre: “que luxo!”. E se contar: “fui assaltada em Paris”, ou “fui atropelada em Paris”, é bem provável que escute: “mas que luxo, ser assaltada (atropelada) em Paris!”".
(...)
"É um verdadeiro luxo, Paris. Não por causa do Louvre, da Place Vêndome ou dos Champs Élisées. Nem pelas mercadorias todas, lindas, chiques, caras, que nem penso em trazer para casa. Meu luxo é andar nas ruas, a qualquer hora da noite ou do dia, sozinha ou acompanhada, a pé, de ônibus ou de metrô (nunca de táxi) e não sentir medo de nada. Melhor: de ninguém. Meu luxo é enfrentar sem medo o corpo a corpo com a cidade, com a multidão".
(...)
"O artigo de luxo que eu traria de Paris para a vida no Brasil, se eu pudesse – artigo que não se globalizou, ao contrário, a cada dia fica mais raro e caro – seria este. O luxo de viver sem medo. Sem medo de que? De doenças? Da velhice? Da morte, da solidão? Não, estes medos fazem parte da condição humana".
(..)
"O luxo de viver sem medo a que me refiro é bem outro. O de circular na cidade sem temer o semelhante, sem que o fantasma de um encontro violento esteja sempre presente. Não escrevi “viver numa sociedade sem violência”, já que a violência é parte integrante da vida social. Basta que a expectativa da violência não predomine sobre todas as outras". (...)
PS – para ler o texto na íntegra clique: http://www.mariaritakehl.psc.br/resultado.php?id=175
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